segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Balada de Um Menino Sem Ritmo

CTAC I
Acho que cansei. O mundo está cada vez mais indo pra um lado que eu não gosto, tem muita coisa errada aí e acho que estou me perdendo na maré. Cada vez mais sinto que estou virando algo que eu nunca quis. Cada vez mais sinto minha conexão com a realidade falhar. Me pergunto se vou virar esse tipo de gente que vemos em filmes que ficam em frente ao computador escrevendo esse tipo de coisa só pra tentar colocar os miolos no lugar. Na verdade quero mais é MANDAR TUDO À MERDA.

Balada de Um Menino Sem Ritmo

IV
5:50
E AS PAREDES DO MEU QUARTO VÃO ASSISTIR COMIGO
À VERSÃO NOVA DE UMA VELHA HISTÓRIA
Snooze
E QUANDO O SOL VIER SOCAR A MINHA CARA
COM CERTEZA VOCÊ JÁ FOI EMBORA
EU ANDO TÃO DOWN
EU ANDO TÃO DOWN
Alarm off.

Quinta feira. Como se fizesse diferença o dia, é sempre a mesma coisa. Sempre.

Calça.
Camisa.
Ôpa.
Camisa.
Desodorante.
Camisa.
Descer.
Bom dia.
Bom dia.
Café.
TV.
Mala.
Carro.
Escola.

Quinze minutos até a aula começar... Odeio esse tempo entre as aulas, é nesse meio tempo que vejo o quanto sou sozinho. Pessoas passam, passam e passam. Riem. Brincam. Conversam. Escuto. Ignoro. Enraiveço. “Ele” passa. Imbecil. Estudamos juntos por cinco anos, fui à sua casa, abri as portas da minha casa pra você, te contei coisas que jamais deveria ter contado, você veio até aqui por minha causa e agora nem olha na minha cara. Imbecil.
Outros passam.
Passam os minutos.
A professora chega.
K chega atrasado.
A aula começa.
K... Ele é alguém que machuquei. Sei disso. Ele sabe. Só não dizemos.
Não sei quanto vale X, mas na dúvida sempre posso chutar 1.
Por que fiz aquilo? Cansei de culpar os outros. Aconteceu no começo do ano. Sim. Nada tinha acontecido na época. Não. Era a primeira semana de aula ou algo assim. De alguma forma começamos a conversar, eu, “ele” e K. Engraçado foi que naquela semana K começou a andar conosco. Ele me irritava, não sei explicar. “Ele” se irritava. “Ele” sabia explicar, e não tinha medo de por em palavras. Passamos a ignorá-lo, simples assim. Sem nenhuma explicação, sem... Nada. Claro que ele entendeu o recado e acabou achando outro grupo, mas... Não foi justo. Nem um pouco justo, na verdade. Sei como se sente alguém quando outros fazem isso com ele. Sei muito bem. Talvez eu devesse pedir desculpas. Mas... Que isso adiantaria agora? Ele... Deve me odiar. Ele... Deve me chamar d’”Ele”. Não o culpo. Me culpo.
É, tenho que falar com ele, mas... O que? Não vejo como chegar e dizer “Oi, sabe aqulio que fiz com você no começo do ano? Então, foi mal aê!”, acho mais provável receber um belo soco merecido na cara e acabar piorando as coisas. Então... Como? Pensando bem... Será que remexer coisas antigas vai fazer bem? Será que não vou... Sei lá, acabar lembrando ele porque ele me despreza tanto? Será...
Será, será, será... Ôpa, que aula é essa? História? Mas não tinha física antes? Droga, não posso perder minha bolsa aqui...
Primeiro Triunvirato.
César.
Ditadura.
Assassinato.
Mas o que esse professor ta fazendo? Isso é o assassinato de César? Talvez ficasse melhor com os noventa senadores com punhais em vez de ficar botando gizes em baixo dos braços fingindo que são adagas, não?
Ok, foi engraçado.
Ainda prefiro o outro professor.
Intervalo.
Lá vão eles de novo, lá vai a manada pastar na quadra… Lá vai “Ele”. Fico eu e o grupo do fundo da sala no recinto. K está lá, junto com outros. Estão brincando de atirar uns aos outros no teto e… Ok, um deles bateu a cabeça no teto.
Acho que tenho que falar com ele.
Ele ta saindo.
Chamo por ele.
- Eu?
Ok, o que dizer? O que…
- Desculpa.
Que bom que pensei em tudo antes, hein?
- Desculpa?
- É… Desculpa pelo que eu fiz com você no começo do ano… Aquilo não… Não foi legal. Não mesmo.
- Ah, ok, relaxa.
É isso?

É, é isso.

Será que ele ficou com mais raiva de mim ainda?
Será que ele vai chamar o pessoal do fundão pra dar um jeito em mim na saída?
Será que fiz certo?

Burro. Pra quê preciso fazer esse tipo de merda?
Que barulho foi esse?
O sinal?
A aula acabou.
Ainda bem que vou andando pra casa, não suportaria ficar olhando para eles todos os dias… Os normais, quer dizer.
Bom, acho que não tenho muito a fazer agora.
Casa.
Sozinho.
Irmão.
Oi.
Oi.
Almoço.
Sono.
Hoje é quinta? MERDA, tem aula de inglês.
Pasta.
Gritos.
Correr.
Inglês.
Inglês… Acho que aqui é um lugar que me sinto menos… Sozinho. Gosto das professoras e dos colegas. São só quatro além de mim, não nos falamos fora das aulas, mas são legais.
Sei a maioria das palavras, mas não sei usá-las bem. Acho que isso não se aplica só ao inglês… Oh bem.
Casa.
Internet.
Pornografia.
Sofá.
Chuveiro.
… Chuveiro.
Cama.

***
5:50
YOU’VE GOT THAT PURE FEEL, SUCH GOOD RESPONSES,
BUT THE PICTURE HAS A MUSTACHE.
Snooze
YOU’VE GOT THAT RAINBOW FEEL BUT THE PICTURE HAS A BEARD.
Alarm Off.

Sexta feira. Lá vamos nós de novo.

Tudo de novo.
Escola.
Cadê minha apostila...? Será que ta aqui dentro do...?
- Oi.
Ãhn? Será que finalmente surtei e estou começando a ouvir coisas?
Não.
- Oi.
K... Ele nunca falou comigo depois daquilo... Será que isso significa... Será que isso significa que fiz a coisa certa?

sábado, 27 de novembro de 2010

Balada de Um Menino Sem Ritmo


III
Um campo verde e aberto e um céu acinzentado... Isso é tudo que posso ver... Como vim parar aqui? Ei, onde estão minhas roupas? Que porra está acontecendo aqui? Vejo uma luz se aproximando à distância... ela vem cada vez mais perto de mim, até que para sobre mim... o que ela quer? O quê...? Estou sendo levantado do chão... Mas por quem? Pelo quê? A luz está chegando mais perto... Mais perto até que...
Escuridão. Abrir os olhos.
Sonho... Ah, que merda... Sabia que assistir “Marte Ataca!” comendo pacotes de minhocas de goma não iria me fazer bem... Que horas são? Meu próximo paciente já deve estar chegando. Será que Luana percebeu que eu estava cochilando no divã?
- Ãhn... Lu?
- Fala, “bem”.
- Qual o nome do próximo paciente, mesmo?
- Hmmmm... – Dizia enquanto procurava um nome em uma tabela que eu não conseguia ver devido ao monitor do computador que ficava ali – Acácio Cecil... Que nome estranho... Deve ser mais um malucão.
Óbviamente Lu não é das mais inteligentes, mas faz bem seu trabalho. Além do que ela alegra o ambiente, se entende o que quero dizer... Essa loiraça mais um pacote de bolachas dava pra passar o mês, haha... Se o namorado dela concordar, é claro. Ah bem, são detalhes, eu acho...
Hm... Vejamos isso aqui... Acácio Cecil, 15 anos, pais católicos, dificuldade em se expressar... Interessante... Aparentemente não quer que os pais saibam que ele estará aqui hoje... Falta de confiança nos pais, talvez?
- Doutor? Seu paciente chegou.
- Obrigado. – Incrível como ela nunca bate na porta, só vai entrando... – Olá, tudo bem? Sou o Doutor Celso Machiavel, você deve ser Acácio, certo?
- ...Olá. – Hmmm falta de expressão, óculos, pequeno sobrepeso... Talvez esteja aqui por causa de problemas na escola... – Doutor...
- Por favor, me chame de Celso.
- Celso... Sei que já disse isso para sua secretária, mas...
- Se for a respeito da confidencialidade de nossas consultas, gostaria que soubesse que tudo que disser aqui será exclusivo nosso, não preciso contar nada disso a ninguém, inclusive seus pais.
- Obrigado... – Ele parece aliviado, acho que acertei um ponto aqui.
- Então, quer alguma coisa? Água, suco...
- Não... obrigado.
- Bem caco... Posso te chamar de caco? Facilitaria muito.
- Acho que pode.
- Então, antes de tudo, queria saber porque você está aqui, óbviamente não foi obrigado por seus pais, então...
- Bem... Acho que posso explicar melhor por isso aqui – Disse tirando alguns papéis amassados do bolso do casaco – Outro dia comecei a escrever isso e... Bem, é isso aí.
- Hmmm... Se importa se eu ler isso um pouco mais tarde? Agora gostaria de falar com você cara a cara.
- Acho que não tem problema.
Comecei a conversar qualquer coisa com ele, na verdade não me importa o que ele fale, contanto que fale... Pacientes demoram um tempo para confiar em nós, psicólogos, geralmente demoram cerca de cinco sessões para conseguirmos chegar a algum lugar. Se todos entregassem uma fórmula pronta de seus problemas como esse aqui nosso trabalho seria bem mais fácil. Não consegui muito na sessão, mas por ser uma primeira sessão, já consegui até mais do que o normal. Vou ler essas coisas depois das minhas consultas de hoje, quando ele vier para sua próxima sessão já espero ter uma base melhor de como trabalhar com ele. Agora... Vamos preencher a ficha dele.
Nome: Acácio Cecil
Idade: 15
Descrição: Branco, moreno, pequeno sobrepeso, 1,71m
Situação:
Hmmmm pensando bem, acho melhor preencher isso depois de ler aquilo lá...

***
Bom, acabaram minhas consultas de hoje, agora vamos ver aquele paciente da manhã... O tal de Cecil... Bem, ele começa com o que deve ser um dos problemas que ele mais quer resolver... Vejo aqui problemas sérios de baixa auto-estima e talvez uma tendência à auto degeneração, mas não creio que realmente possa cumprir suas ameaças... Creio que após esses incidentes ele tenha criado um tipo de mecanismo que o impede de confiar nas pessoas, talvez assim ele ache que não possa mais se machucar com as pessoas. Isso é muito interessante, na verdade, ele está se ajudando e percebe isso, guardar essas coisas para si nunca é a melhor solução. Devo recomendar que continue com esse tipo de exercício.

***
- Então, caco, quer fazer alguma coisa? Essa é nossa quarta sessão, acho que você merece sair um pouco, não é?
- Acho que sim...
- Então vamos dar uma volta pelo bairro, sim?
O Bairro na verdade não tinha muita coisa, andamos pelas ruas e acabamos sentando em um banco de uma praça.
- Ei, agora que pensei... O que seus pais acham que você está fazendo quando vem para cá?
- Meus pais... Trabalham muito... Contanto que esteja em casa às sete da noite, que é quando eles chegam, não suspeitarão de nada.
- Mas vocês não conversam sobre o dia de vocês?
- Bom, eles até perguntam, mas eu falo “Foi normal” e eles não fazem mais perguntas.
- Entendo...
O garoto é legal... Pena que não tem tanta personalidade... Caramba, crianças podem ser tão más umas com as outras, não é mesmo? Imagino como não deve ser o dia desse moleque na escola...
- Celso?
- Sim?
- Me responde uma coisa?
- Vou tentar.
- Você já conseguiu descobrir por que eu sou tão fraco?
- Caco... Você tem que entender que é diferente você se sentir fraco e ser fraco, e se você quer saber, no fundo no fundo ninguém é fraco. Essas pessoas repetem tanto para si mesmas algo que acabam acreditando naquilo. Acho que não preciso te dizer isso, certo? Então, pensando nisso, devo te dizer algo que não é fácil de ser dito, mas que é necessário. Você, Caco, é fraco porque você decidiu ser. As pessoas até podem ter uma parcela de culpa, sei que têm e sei que também machucam, mas se você não se abrir para elas, elas vão continuar a te julgar por seu exterior, cara! E vou te falar, se você deixar isso acontecer, elas dificilmente vão te olhar de outra forma de novo! Não falo isso por mal, espero que você saiba que não, na verdade é justamente pelo contrário, falo isso porque quero vê-lo feliz de novo. Mais uma coisa, carinha, ninguém consegue ser feliz sozinho, porque a felicidade é algo que temos necessidade de compartilhar com os outros.
- Hm... Eu... Ok.
Merda. Porque falei aquilo? Fantástico Celso, fantástico! Por favor, fala alguma coisa! Nem que seja pra gritar “Há! Pegadinha do Malandro!”, mas fale, senão esse menino nunca mais vai voltar no seu consultório de novo!
- Ei, escuta, eu...
- Obrigado.
- Eu... Então... De nada.
Tá, que porra foi essa? Por favor, alguém me diz que estou no Topa Tudo por Dinheiro, eu acabei de gritar com ele e ele me agradece?
- Sabe, as pessoas sempre tentaram falar “suave” comigo, nunca ninguém foi tão direto assim... Não sei se concordo com o que você falou, mas agradeço o jeito como o fez.
- Ah, também não é assim, né? Não é possível que você tenha gostado de ter tomado bronca! Devo anotar Masoquismo no meu bloquinho também?
Silêncio.
- Foi uma piada, não precisa ficar chateado.
- Não é isso, é só que... É só que eu estou começando a me abrir com alguém de novo e...
- Sei que isso dá medo, mas não precisa fazer isso de uma vez, sabe, se quiser, pode me entregar aquelas suas folhas quando achar melhor, não precisa ser na ordem, nem precisa ser toda semana, quero que você se sinta confortável com o que estiver me entregando, ok?
- Certo.
Acho que consegui alguma coisa aqui, senhoras e senhores! Do jeito que vai, eu posso estar com o Marcus daquele filme com o Hugh Grant na minha frente! Caramba, qual era o nome daquele filme mesmo? Ah, não importa. A semente foi plantada, vamos ver agora se ela resolve dar frutos ou não.

Mudando de assunto, acho melhor passar no mercado, senão vou ter que comer a ração do meu gato pro jantar...

Balada de Um Menino Sem Ritmo


II
BURRO BURRO BURRO, TRÊS VEZES BURRO, IMBECIL! FRACO! POR QUE NÃO CONSEGUI? ELE ESTAVA LÁ... ELE ESTAVA LÁ... Ele... Ele... Merda... Não posso chorar... Não posso... Se minha mãe me vir assim ela vai... Eu vou... Não...

***
Ok, acho que me acalmei... Um pouco... Eu... Eu... Não pude. Estava com o revólver na minha mochila, com tudo pronto... Esperei até que todos tivessem saído... Sabe, a carteira dele tinha sido sumida e ele tinha ficado para procurar... Ele estava lá, eu estava lá... Fui tirar o revólver da mochila, mas... Acho que é o que eu sou e o que vou sempre ser, FRACO, SUBMISSO, VEGETAL. Talvez eles tenham razão, talvez... Talvez se eu arranjar uma torradeira... Sim, ou morder um cabo elétrico de alta tensão... Talvez... Cortar os pulsos é bobagem, nunca que conseguiria fazer um corte fundo o suficiente para pegar uma artéria e, mesmo que conseguisse, meu pulso estaria tão ferrado que não poderia cortar o outro... Me enforcar também não é opção, se eu errar o nó... Também não quero entrar em coma por causa de uma overdose de remédios, então... Quem sabe um dia não tomo coragem? Um dia, talvez...
Já que estou aqui, acho que podíamos matar o tempo conversando, não? Não? Ah, então vou falar sozinho.
Engraçado... Incrível como nos filmes o ato de se matar alguém pode ser tão simples, não é? Quer dizer... É só apertar um botão e puf, acabou, sem ressentimentos, arrependimentos e hesitações... Sem dor do lado de quem puxa o gatilho, é sempre a mesma história do mocinho que quer vingança contra o bandido do mal, não é? Ah, mas existem filmes que a tratam com a seriedade devida, Sonho de Cassandra é um deles... Fala de dois irmãos, um precisa de dinheiro para investir nos negócios de um amigo, outro precisa pagar dívidas de apostas e eles vão pedir a grana pro tio, o tio libera, mas com a condição de eles matarem uma pessoa que atrapalha seus negócios... No filme inteiro somente são disparados três tiros, mas esses tiros valem mais do que três milhões de tiros disparados em qualquer outro filme. Hm... Três tiros... Isso me lembrou da minha primeira namorada... Sim, já tive namoradas, ok? Não precisamos fazer circo sobre isso, né? Agora que penso, começamos a namorar na sexta série também... Poxa vida, que diabos a sexta série tem? Se eu conseguir lembrar de mais alguma coisa vão ser três acontecimentos na 6ª... 666... Mas aquele ano foi mesmo um inferno? Não, não mesmo... O nome dela... O nome dela começava com L e era bonita, sim... Cabelo e olhos castanho claros e “magrelinha” como minha avó dizia... Caramba, eu gostava dela... O que ela viu em mim, não me pergunte, se já não sou bonito hoje, antes era menos ainda, uns 50 cm a menos e uns 20 Kg a mais. Era aula de... De... Alguma coisa, nós dois estávamos trocando mensagens, vou transcrever aqui a parte final:
“Você tem namorada?”
“Não, e você?”
“Também não.”
“...”
“Você quer namorar comigo? []Sim []Não”

Primeiro tiro. Sempre dou risada ao lembrar disso, depois dessa última, pra responder eu rasguei o começo e o fim da mensagem, ficando só o “Sim” no papel e mandei pra ela, eis o que aconteceu:
“Sim o quê?”
“À sua pergunta”
“Então estamos namorando?”

Não sei por que, mas me pareceu inteligente entregar o mesmo papel rasgado escrito “Sim” como resposta... Acho que já não batia bem naquela época.
Nosso namoro, se é que pode se chamar assim, se resumia a escutar meu discman atrás da escola, enquanto esperávamos a perua escolar... Talvez pareça coisa meio retardada, mas eu amava aqueles momentos. Continuamos nessa mesma rotina por um mês, na data exata resolvi pedir um beijo (mesmo um selinho que fosse).
- Não, ainda não, quero ver se gosto mesmo de você antes.
Não fiquei triste, muito pelo contrário, dessa forma, sabia que no dia em que ela me beijasse, ela teria certeza do que fazia, que eu seria o “escolhido”, por assim dizer. Por uma ou dias vezes no mês seguinte ela pensou em me dar o fora (Segundo tiro), primeiro uma semana, depois três dias, mas no final continuamos juntos. Um dia, quando íamos para os fundos da escola, ela me pediu um beijo (sim, um beijo!) de despedida. Foi um simples encontrar de lábios, mas aquilo já foi suficiente para me deixar nas nuvens. Uma semana depois ela apareceu para mim com um anel de casca de coco que só cabia no meu polegar e não me deixava dobrá-lo, mas usava o anel mesmo assim. Chegávamos ao final de Agosto, e eu temia que aquele beijo tivesse sido um fato isolado que nunca tornaria a se repetir. Decidi ir à luta. Um passeio para o Hopi Hari foi o evento escolhido, ali eu tinha que conseguir no mínimo mais um beijinho que fosse. Logo que descemos do ônibus, dei um jeito de despistar o resto do grupo, mas não percebi que junto despistara-a também. É patético, sei disso, tragicômico, até, mas havia me perdido dos meus amigos e de minha namorada. Passei metade do dia tentando encontrá-la, até que finalmente consegui. Fato estranho foi que na hora em que a encontrei, ela começou a dizer como três pessoas diferentes haviam tentado seduzi-la e como tinha sido fiel a mim. Até hoje não sei ao certo por que ela me disse aquilo... Talvez estivesse me testando, talvez aquela fosse a verdade simples, talvez, talvez, talvez, decidi que existem coisas na vida que são melhores quando deixadas de lado. Depois do estanho relato, me chamou para irmos a um brinquedo chamado “A Montanha Encantada”, que basicamente consistia de um barco que deslizava sobre trilhos submarinos e com música alegre. No caminho tentei segurar sua mão... Senti um arrepio em sua mão quando a toquei, e três segundos depois ela me puxava, me fazendo correr até o brinquedo.
O dia chegava ao fim, depois de tomarmos uma bruta chuva na corria até o ônibus, vi ali que meu dia havia terminado, e que minhas esperanças por afeto haviam sido frustradas.
No caminho de volta conversamos, mas nada sério somente bobagens. Não me lembro de nada importante na viagem de volta, o que realmente importou foi a espera por meus pais. Como já disse, estava chovendo, e muito, então buscamos abrigo em uma cabine de segurança. Ali, ficamos olhando um para o outro e conversando... Conversando... Ah sim, outro detalhe para a tragicomédia, não sei como, não sei por que, mas a maldita cabine de concreto ficava constantemente me dando choques, então fiquei assim, conversando, olhando para ela e tomando choques, até que ela chamou por mim e projetou seu corpo para frente. Como havia passado seis meses e não havia conseguido nada melhor que um beijo simples, achei que era isso que ela queria, mais um beijo simples, imagine agora minha felicidade quando ela ordenou(sim, ordenou) que eu beijasse direito. Beijei. Ah, ainda lembro daquele dia. Frio e eletrocutado, mas feliz como o diabo, tinha certeza ali que a partir daquele ponto as coisas iriam melhorar, mas para minha surpresa simplesmente voltaram ao que era antes. Agora já estávamos na 7ª série, entre agosto de um ano e março de outro só vejo uma ocorrência digna de menção. Ficávamos nós dois conversando pela internet frequentemente, até que certo dia após um elogio ou outro ela disse que me amava. Sabia o que devia responder, o que a convenção mandava, mas não sabia se era isso que sentia por ela. Acho que fiquei cerca de um minuto sem responder, até que ela resolveu chamar minha atenção e acabei digitando as malditas palavras.
Também te amo.
Dessa ocorrência até março mastiguei essas palavras, pensava nelas todos os dias, olhava para elas e para ela e tentava olhar para dentro de mim. Novamente, depois de repetir incessantemente algo para mim mesmo, me convenci de que aquilo era verdade. Convenci-me de que a amava. Na verdade, Ela me convenceu de que a amava. Chegamos a março, maldito março... Dizem que março é um mês feliz, onde é quente o suficiente para andar na rua de camiseta sem uma blusa, se é quanto à blusa que reclamam, não vejo porque não estão certos. Bem, março parecia um mês como qualquer outro de tantos outros que o precederam, ao meu ver, as coisas não estavam perfeitas, mas não estavam horríveis também. Estava feliz. Talvez pudesse estar mais, mas para aquele momento, era o suficiente. Direto ao ponto, assim como seu começo, o término do namoro se deu por meio de uma mensagem. A mensagem era:
“Nerd gordinho, Não quero mais namorar com você porque está muito chato”.
Simples, direta, mas por algum motivo não doeu tanto quanto achei que deveria doer. Achei naquele momento que ela tinha razão, que realmente o que fazíamos mais se aproximava a uma amizade simples do que de um namoro. Na hora, aceitei. Teria ficado tudo bem, se não fosse o que aconteceu exatos cinco minutos após a mensagem ser entregue a mim.
Cinco minutos, esse foi o tempo em que ela levou para sair da classe e encontrar F (Terceiro e último tiro). Sim, F! Não pude acreditar, mas ela estava realmente tentando fazer com que ele namorasse com ela. Não preciso dizer que se já tive raiva naquele momento, “Ele” só ajudou a aumentar essa raiva. Não se preocupe, F não chegou nem perto de ter algo com ela que não fosse amizade, acho que o pouco que lhe restava de respeito a mim não deixou-o consumar os atos. Não fiquei tão bravo com F, mas sinto que não fiquei tão irritado quanto devia com ela. Bastou vê-la com F para perceber que sempre que estávamos juntos, F estava por perto ou em algum lugar que pudesse nos ver, que aquela semana e aqueles três dias foram as exatas datas em que F brigara com a namorada, que ela só me usara, que eu havia sido um marionete mais uma vez e não tinha percebido. Percebi tudo isso, mas não tive raiva, interessante, não? Acho que afinal o Amor que cultivei foi tão forte que não me deixou ficar bravo com ela. Hoje, a vejo online, depois que ela saiu do colégio, a vi outras três vezes, três aniversários dela. Um desses, sua festa de 15 anos, dancei em seu baile, mais tarde soube que ela havia convidado F primeiro, mas que ele não havia aceitado.
Às vezes quando acho que não posso ser mais patético sempre me lembro de algo que me faz perceber que sou mais ainda... Será... Será que se eu conseguir que alguém me ouça... Será que consigo deixar de ser tão fraco? Duvido... Por outro lado, escrever isso está me fazendo bem, quer dizer... Sinto que estou tirando pesos e mais pesos das minhas costas... Suponho que pior que está não pode ficar... Ok, falei sem pensar, comigo TUDO pode sempre piorar... Quem sabe... Talvez eu fale com alguém... Talvez... Mas... Quem?

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Balada de Um Menino Sem Ritmo

I
Me apegar... Ta aí algo que acho difícil... Invejo como outros têm essa facilidade de manter vínculos com outras pessoas e seres, para eles é algo tão... Natural... Eu queria ser assim... Normal.
Sempre fui um menino tímido... Pelo menos é o que minha mãe me diz, segundo ela sempre fui recluso no primário, reclusão que se agravou durante os anos... Hoje estou no primeiro ano, se bem que sinto que devia ter repetido no mínimo duas vezes... Não estou reclamando, só apontando os fatos, você me entende, certo...?
Acho que me desviei um pouco do assunto, só quero que você entenda o que eu sou e espero que me diga por que sou assim, já que ninguém parece querer me ajudar.
Bem, antes de tudo, preciso explicar a razão de hoje eu ser um “vegetal”, como eles dizem. Ah sim, “vegetal”... Achei criativo quando vieram com essa, aparentemente para eles eu devo estar em estado vegetativo, já que não abro minha boca durante as seis horas de tortura contínua que chamam de dia escolar, acho engraçado que tenham tanto tempo para pensar em apelidos para mim sendo que nunca tentaram falar comigo... Talvez... Talvez tenha sido culpa minha? Talvez eu tenha sempre tido essa coisa dentro de mim que faz meu exterior parecer tão... Derrotado... Talvez... Talvez isso seja comum... Quem sabe não existe um menino igual a mim nos Estados Unidos? Se bem que acho que, se esse menino existe, ele já deve ter surtado e matado todos da sala dele com um rifle semi-automático e um palito de dente... Mas se for pensar em proporções, devem existir mais cinco na China e outros cinco na Índia... A diferença é que esses caras têm a opção de se juntar...
Quero ir pra china um dia, sentir o vento que deve soprar em cima da grande muralha... Quem sabe não encontro alguém que goste de mim por lá...? Acho que alguém em um país de alguns bilhões de pessoas deve gostar desse nerd gordinho aqui... Ah, falando em nerd gordinho, percebi que ainda nem comecei minha história, não é? Bem, vamos lá então.
De onde parei... vamos ver... ah sim, de como me tornei um vegetal (Tenho que lembrar de apagar aquelas coisas dali depois...).
Hmmm... Acho que posso começar a história da sexta série, foi esse o ano em que “ele” entrou... Não vou citar nomes, mas também não vou ficar encobrindo quem são essas pessoas, elas sabem quem são, quem sabe quando lerem isso não percebem o quanto podem foder com as pessoas... Há, essa é boa, até parece, não é? Enfim, era o primeiro dia da sexta série, nessa época eu já era tímido e recluso e tudo isso, mas não um vegetal, ainda não.
De qualquer forma, era o primeiro dia da sexta série e... eu já disse isso, não? É, já... bom, era o primeiro dia da sexta série, na época eu ainda não sabia, mas o primeiro dia naquela escola era só para alunos novos conhecerem o colégio, logo, nenhum dos meus agora ex-amigos tinha ido à escola naquele dia. Por capricho maldoso de seja lá quem vocês acreditam, sentei-me ao lado de um menino novo... Ele parecia com medo, não sei... Parecia estar esperando que alguém viesse e lhe desse um soco na boca... Ah, maldito seja aquele dia, se eu soubesse tudo que aquela criatura que se sentava ao meu lado me faria passar... É, provavelmente eu daria um soco na boca de um menino que eu nunca tinha visto na vida e fosse expulso da escola por... sei lá, xenofobia ou homofobia ou algo do gênero... Talvez eu devesse dar um soco na boca dele hoje, talvez assim quando ele dissesse que eu quebrei-lhe os dentes eu pudesse retrucar que ele quebrou minha vida... Bom, final da história: No final do dia eu tinha feito (argh...) amizade com ele. Na hora ele pareceu ser mais um cara legal e ok, continuemos com a vida, certo? É, achei que seria assim, mas não foi. Na época, éramos um grupo de cinco, seis contando com ele, e desses, tinha um em particular que era o meu melhor amigo... acho que vou chamar ele de amigo F. Por quê F? Oras, por que não F? F é uma letra simpática, uma letra legal, palavras como Flamingo começam com F. Quem não gosta de flamingos? Enfim, na época éramos sempre eu e F, quando tínhamos trabalhos em dupla, nunca pensava duas vezes, F era a escolha óbvia. Se você quer saber, acho que era isso que o deixava louco... De repente, ele começou a “apontar”, digamos assim, coisas sobre F, e de tanto apontar, eu comecei a acreditar nesses apontamentos... Fui idiota, sim, muito idiota... Idiota ao ponto de acreditar no que ele me dizia... O incrível foi que em questão de meses, já não falava mais com F e com metade do grupo original, pior ainda, quem restou do começo mudou, me atrevo a dizer que eu mudei. Temo que foi nesse ponto que comecei a perder minha inocência. Se você é um dos retardados que fará piadinhas do tipo “Ele tirou sua inocência, foi bom pra você?” já peço que guarde seus comentários inúteis para você. Bem, idiotas à parte e voltando à questão da inocência... Foi incrível a rapidez com que passamos de assuntos como jogos online e o novo filme da Disney para histórias mentirosas de perda de virgindade e sites pornográficos interessantes na internet, quer dizer, tínhamos doze anos, por Deus! Ok, talvez eu esteja demonizando “ele”, sei muito bem que a culpa não foi só dele, mas... Talvez eu esteja sendo injusto...? Talvez... Não, talvez eu esteja exagerando um pouco, mas sei que é verdade, sei que sim! Você acredita em mim, não é? Não é? Acho que sim... ou não, não sei.
De qualquer forma, ele sendo ou não responsável, o fato foi que eu e F nunca mais nos falamos e que nós mudamos. Mas agora que fica estranho... Não sei o que aconteceu, realmente não sei, mas outras pessoas também param de falar comigo, e isso foi acontecendo pouco a pouco, até que quando dei por mim, ele era meu único amigo. Confiei nele, contei-lhe coisas que nunca tinha contado para ninguém... E ele me traiu.
Tudo aconteceu quando passávamos para o ensino médio e eu decidi que aquele colégio em que estava simplesmente não era o que eu tinha de melhor e decidi mudar para outro. Qual não foi minha surpresa ao descobrir que “ele” também viria comigo para o mesmo colégio? É triste, mas na época eu gostei.
O ano começou, pessoas vieram e foram, e quando percebi todos os meus amigos não eram meus amigos, eram amigos DELE! ELE escolheu meus amigos ELE manipulava minha vida, diabos, ELE até me incitou a virar homossexual! Se querem saber, temo que ele goste de mim, quem sabe até hoje... Quem sabe... Bom, continuando... Tudo correu como sempre corria até o fatídico dia em que ELE me chamou para conversar. Parecia normal, por mim estava tudo muito bem, até que ele disse as exatas palavras: “Ninguém mais daqui gosta de você” ele disse, “Você tem que mudar”, ele disse... Até tentei mudar de grupo, juro que tentei, mas SURPRESA, ELE se juntou ao grupo novo! Um grupo que ele SEQUER DIZIA OLÁ, e poxa vida, QUE COINCIDÊNCIA, uma semana depois ELE vem me dizer novamente, “NINGUÉM MAIS DAQUI GOSTA DE VOCÊ”. Foi nesse ponto em que eu decidi que não mudaria, que não é por causa DELE que vou mudar meu jeito de ser. NÃO! E, quer saber mais? ELE VAI PAGAR, VAI PAGAR SIM! Pois eu garanto, ISSO NÃO PASSARÁ MAIS UM DIA SEQUER SEM NENHUM TIPO DE PUNIÇÃO, NEM MAIS UM DIA EU DISSE!
Vou resolver
Vou Resolver
VOU RESOLVER
RESOLVER
REVÓLVER

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

A Noite Começa

"Traguei um bom gole de veneno. — Seja três vezes abençoada minha resolução! — Minhas entranhas ardem. A violência do veneno contrai-me os membros, desfigura-me, arroja-me ao chão. Morro de sede, sufoco, não posso gritar. É o inferno, as penas eternas! Vede como o fogo se levanta! Queimo-me, como convém. Vai, demônio!"
Arthur Rimbaud, Noite do Inferno.

Local onde postarei minhas histórias e coisas do gênero. Críticas são bem vindas.

O Ouro dos Condenados


O Ouro dos Condenados
I
William Stronghold entrou na delegacia de polícia com a placa de “Procura-se” na mão. O angorá velho que se sentava atrás da mesa o sondou. Calças de couro, camisa simples de algodão, um revólver em cada lado da cintura, chapéu de couro e pelagem salmão. “Interessante” pensou o velho.
- Dia – grunhiu o velho.
- Dia – respondeu o recém chegado – venho pelo emprego.
- Acha que dá conta?
- Acho.
- Mesmo sabendo que Johnny Jones é a causa de termos perdido os últimos cinco xerifes?
- Ele não me assusta.
- Pois devia... ah bem, se quiser, o emprego é seu.
Assim William Stronghold tornou-se o xerife Stronghold. As duas semanas que se seguiram foram tranqüilas, um par de arruaceiros e um roubo à mercearia de um siamês pacifista que se deixou ser assaltado por um adolescente com um pedaço de madeira e nada mais.
O dia nasceu preguiçoso, os raios de sol batiam em seus bigodes, dando-lhe a impressão de que bons ares viriam, trazendo, quem sabe, chuva àquele deserto depressivo.
Uma diligência vinda do oeste surgia no horizonte. Provavelmente mineradores bem sucedidos em sua busca por ouro no oeste que agora voltavam devidamente abastecidos com as riquezas que recolheram.
Obviamente, assim como ele havia falar daquela passagem que fariam pela cidade, outros também poderiam fazer e, por isso, plantava guarda em frente à delegacia, pronto para agir ao primeiro sinal de que algo corria errado.
Conforme as carroças se aproximavam, Stronghold examinava as tábuas de madeira da calçada e as construções de madeira ressecadas, pensando no quão frágil elas eram, como...
- Xerife?
Virou-se. Um pequeno persa puxava a barra de sua camisa.
- Tom?
- Quem são? Perguntava apontando para o oeste.
- Viajantes de longe... é melhor você ficar em casa hoje, garoto.
- Mas eu o David íamos até o poço brincar!
- Vão amanhã... Por hoje fiquem em casa, sim?
- Ah, mas... Mas... ta bom...
Observou o garoto enquanto sumia pela estrada ao mesmo tempo em que mantinha os olhos amarelos fixos na diligência.
Chegaram ao som de animadoras conversas sobre novas vidas e sobre como uma tempestade parecia se aproximar.
Quando pararam, dividiram-se em três grupos: um que se dirigiu à estalagem, outro para o bar e, o terceiro, para estacionar as carroças. O xerife decidiu escoltar o terceiro.
Seguiu-os até os fundos da estalagem, onde amarraram os cavalos junto a um bebedouro para clientes do edifício.
Conversou com o felino musculoso com sotaque sulista que liderava a excursão. Vinham de uma mina da costa e viajavam há algumas semanas.
- Temos muitas pessoas que não gostam dessa coisa de ferrovia, por isso decidimos vir por esta rota.
Compreensível, mas não aceitável. Viajar com carroças carregadas de riquezas com duas ou três armas no comboio era a mesma coisa que não protegê-las com nada.
Ao se certificar que de sua tocaia poderia ver ao mesmo tempo a rua e as carroças, voltou a montar guarda.
Quando o sol estava a pino, percebeu cavalos surgindo a leste e, com eles, cavaleiros sem honra e prontos para tentar seu grande roubo.
Os malditos chegaram altirando.
Alguns corriam para suas armas, outros para um lugar seguro, outros para um bom local para assistir.
Stronghold abrigou-se atrás de uma das carroças. O alcance dos tiros não chegava nem perto da distância em que estavam, por isso era melhor que a única munição a ser desperdiçada fosse a deles.
Esperou pacientemente até que entrassem em seu raio de ação e então saiu de seu esconderijo, acertando um tiro na cabeça de um deles e outro no tórax de outro. Eram cerca de onze homens... Injustiça para com eles.
Após estes dois, os outros nove dirigiram sua atenção para ele, que voltava a seu esconderijo anterior.
Tiros passavam por entre as tábuas da carroça e novamente o xerife esperou.
Quando pararam de atirar, cerca de setenta tiros depois, novamente saiu, acertando outros três antes que terminassem de recarregar.
- Parem com isso seus idiotas! Desse jeito vão ficar sem munição! Gritava o gato branco atrás do bando – já chega dessa brincadeira. Ei, você aí atrás! Já conseguiu provar que é machão, mas agora que tal deixar a gente levar isso e aí eu penso em não fazer um colar com a sua cabeça?
- Quer minha cabeça? Vem buscar!
- Hemp, Straight, vão por cada lado da carroça. Watson, por cima – sussurrava para os subordinados enquanto preparava uma banana de dinamite.
Os corsários aproximaram-se com cautela. Trocaram um olhar de aprovação e seguiram. Contornaram a carroça e...
Ninguém. Então, onde...
Um tiro atravessou o atirador em cima da carroça entrando pela virilha e outros dois nos respectivos peitos dos restantes antes mesmo que pudessem perceber o que acontecera.
Stonghold estava prestes a sair da carroça e voltar a seu esconderijo quando a dinamite passou voando e aterrissando ao lado da carroça. O xerife pulou agilmente para fora da carroça, distribuindo tiros e os recebendo.
Outros dois caíram, deixando o xerife e o líder cara a cara enquanto a carroça explodia, espalhando estilhaços para todos os lados.
Entreolharam-se, apertando os gatilhos ao mesmo tempo enquanto um pulava para a direita e o outro, para a esquerda.
Um tiro atravessou o lado esquerdo do abdômen do xerife, e outro o crânio de seu adversário, arremessando seu chapéu para trás revelando as orelhas pretas contrastando com a pelagem branca e com o vermelho do sangue que escorria de sua testa.
Silencio.
Enquanto alguns recolhiam o que sobrara de seus pertences, outros tratavam de despejar os corpos em local apropriado enquanto o xerife era atendido por um médico local, seu primeiro e, esperava ele, o único paciente daquela noite.
O sol se punha trazendo a chuva com o anoitecer. O xerife deitou-se, mirando o teto e tentando tirar sua atenção do ferimento. Os olhos aos poucos foram se fechando e então, adormeceu.
Gritos.
Acordou com um pulo na escuridão. O abdômen gritando de dor.
Luz entrava pela janela mostrando sombras correndo.
Espiou pela janela.
Casas em chamas, gente morta nas ruas, caos, confusão e ...
Uma cauda projetou-se por debaixo da janela. Stronghold segurou-a, puxando-a para dentro e revelando Tom, aterrorizado gritando.
- Tom! Ei, sou eu! Gritou tentando acalmar o garoto.
- Xerife? Você ta vivo! Disse abraçando-o – eles mataram minha mãe! Gritava encharcando as vestes do xerife.
- Eles? Eles quem?
- O demônio! O espólio do inferno! Johnny Jones veio pelo ouro!
- Jones... ?! Preste atenção, você vai ficar aqui e só vai sair quando eu vir te buscar, OK? Dizia enquanto colocava seu cinto e munição no revólver – fique com este aqui, e se alguém que você não conhece entrar, atire  - disse entregando um revólver velho nas mãos do garoto –vou resolver esta confusão.
O xerife pulou a janela, se esgueirando pela rua mal iluminada, dedos nos gatilhos prontos para a ação.

II
Corpos, corpos e mais corpos. Avalanches de corpos nas ruas.
Haviam três deles na estalagem onde Stronghold entrou. Examinava com cautela o amiente, os sentidos aguçados a ponto de bala. O térreo apresentava-se ausente de qualquer vida aparente. Arriscou um olhar pela janela dos fundos. Cinco vultos carregavam suas carroças com caixas das outras carroças que estavam a pilhar sob a luz do luar e da cidade em chamas.
A mira de seus revólveres apontaram para dois daqueles vultos malditos, lentamente apertando os gatilhos... Lentamente...
No momento em que o cão da arma estava prestes a descer sobre a traseira da bala engatilhada do primeiro revólver ouviu-se uma agitação vinda do andar superior, congelando e ao mesmo tempo retirando os dedos do xerife de sua mortal precisão.
Stronghold correu, buscando abrigo atrás de um sofá mofado encostado perto de uma das paredes, em um ponto de onde podia ver parte do sofá maior, perto da janela de onde viera e uma cabeça de alce pendurada na parede, deixando-o alheio à maior parte do aposento.
- Anda! Desce logo, sua puta!
Um gemido. Em seu esconderijo, o xerife só podia supor o que acontecia do outro lado daquele sofá. Provavelmente um dos pilhantes buscava algo mais além do ouro e parecia estar prestes a consegui-lo com alguma pobre coitada que não soube se esconder direito.
Outro gemido, seguido de vários outros enquanto uma perturbação mexia com o equilíbrio do sofá.
Quando os movimentos do sofá começaram a repetir-se, impondo certo ritmo macabro, Stronghold puxou da bota uma pequena faca de 15 centímetros e preparou-se para pegar o filho da puta quando vacilasse um segundo que fosse e pronto. Poucos segundos depois, quando a “diversão” chegava a seu clímax, o momento chegara. No exato instante em que o agressor levava a cabeça para cima e revirava os olhos o xerife investia contra seu pescoço, a faca cortando fora sua cabeça com estranha facilidade, como se tivesse perfurado gelatina envolta em papel.
A mulher gritava histericamente, mas dessa vez era devido ao corpo sem cabeça vazando areia no lugar de sangue em cima dela, ainda penetrando-a, apesar do fato de que agora começava a broxar.
Atônito, Stronghold examinava a cabeça decepada que tinha em mãos... Pelagem e olhos totalmente brancos e com pedaços de crânio aparecendo. Inferno, se não tivesse matado aquele demônio com as próprias mãos alguns segundos antes poderia jurar que estava morto há pelo menos seis meses!
A mulher correu porta a fora, peitos ainda de fora com as mãos tapando-os em um desespero frenético, soluçando e tropeçando nos corpos pelo caminho.
Não se preocupou em segui-la, tinha coisas mais urgentes e mais estranhas a tratar do que uma puta comida por ser estúpida. Voltou à janela, agora rezando para que aquela fosse a única daquelas coisas e que, caso esse não fosse o caso, que suas balas causassem algum efeito sério nelas. Dessa vez, só conseguiu distinguir três vultos sob o luar.
Três... Então onde estavam os outros dois? Será que seus olhos falhavam? Será que estavam nas carroças? Será que...
- Ora, ora, ora, que temos aqui? – Disse uma voz por trás dele.
Virou-se com um pulo. Duas daquelas coisas o encaravam, apontando-lhe um revólver cada uma.
- Cheia a rato, se quer saber. – Respondeu uma delas.
- Xerife, huh? – Dizia apontando a arma para o distintivo – Johnny vai ficar feliz em te conhecer.
- Que é isso...? Ah droga! Sharp, ele pegou o Whesker! Maldito... – Gritou a outra, examinando os restos da coisa há pouco morta... ou remorta... num mesmo eu sei dizer que termo se usaria para uma coisa dessas...
- Calma, Straight, calma... Tudo a seu tempo. Whesker era um retardado que não conseguia pensar com uma cabeça só e quando o fazia era com a errada. Agora... Seja cavalheiro e abaixe suas armas, sim, xerife?
Stronghold jogou os revólveres a seus próprios pés, na esperança de que algum deles viria recolhê-los e, quando um deles realmente o fez, percebeu ali que sua chance chegara. Assim que a coisa se abaixou, segurou-a pelo pescoço com o braço, puxando-a para cima no exato momento em que a outra abria fogo contra ele, acertando o escudo (humano?) improvisado e fazendo pequenos rios de areia brotar de sua pele.
Jogou a coisa-escudo em seu atacante pulando também em cima dele, caindo com ele no chão, socando-lhe a cara com ferocidade, arrancando-lhe o maxilar empoeirado com o impacto e terminando o serviço quebrando-lhe o pescoço. Poucos instantes depois percebeu que a primeira criatura, que julgava morta após receber três tiros no peito e na cabeça, começava a se levantar. Caminhou por trás dela e virou sua cabeça em 360°, deixando dunas de pó no chão.
Tropeçou.
Levantou-se, tudo girava ao seu redor, o abdômen vermelho de sangue. Sentia a luz fugindo de seus olhos e o ar entrando como navalhas em seus pulmões enquanto voltava a sentir a madeira do piso da estalagem em seu rosto.
Desmaiou.

***

-... para cima, idiota, já disse!
- Ok, chefe, ok!
- Capachos... Inúteis! Vou arrancar o couro de cada um de vocês e costurar uma merda de um suéter com eles! Vou... Ôpa! Que bom que acordou, senhor Xerife! Puxa, que trabalheira danada que você deu pra nóis!
Lentamente, os olhos do Xerife abriram e fecharam várias vezes, procurando foco e tentando se acostumarem com a luz. Assim que o fizeram, puderam localizar o que seria os restos dos fundos da estalagem. Stronghold estava amarrado em uma das carroças com quatro criaturas encarando-o seriamente.
- Sabe, xerife, eu e meus rapazes tínhamos um plano simples; vir, roubar, matar e cair fora, mas você tinha que meter o teu focinho né não? Cê tinha que dar uma de fodão né? – Falava a criatura mais à frente, com calças largas, botas, casaco de couro e chapéu. Olhou-o, um olho azul, normal, mas outro totalmente branco. Pelagem rajada em tons de cinza, preto e branco com um dos caninos quebrados – Ce quase bateu as botas, sabia? Quando os capacho te encontraram tinha mais sangue no chão do que no teu corpo! Veja só que coisa! Mas... Eu não ia deixa ocê se safá assim numa boa não... tu sangro três cabra meu... dois bons. Ah, mas não se preocupe, vo manda ocê pra se encontrá com eles logo logo... mas o gatinho aqui vai brincar um pouco com o ratinho que ele pegou.
Seja lá o que fosse, o Xerife descobriu uma coisa sobre Johnny Jones: Ele falava demais. Tanto que não percebeu que ele havia virado seu cinto para trás e havia conseguido cortar suas amarras com ela.
- Presta atenção em mim, ô caralho! To falando coôce! – Gritava enquanto acertava uma coronhada na bochecha de Stronghold.
Virou-se e cuspiu sangue que brotava do interior de sua boca. O líquido era muito diferente do normal, era grosso e, após cuspir pôde ver, muito mais escuro, quase beirando o preto.
- Não quer me ouvir? Tão ta bão... vamo começá. – Dizia enquanto empunhava um ferrete pronto para a marcação, exibindo um losango com um Y dentro e duas linhas paralelas, marcando o meio e o fim do Y vermelhos e exalando fumaça no ar noturno.
Um barulho de carne encostando na chapa quente se fez ouvir quando o objeto encontrou a testa do Xerife enquanto as coisas riam. Nesse momento, Stronghold atirou-se para uma das criaturas à esquerda, quebrando-lhe o pescoço e fugindo em direção à estalagem antes mesmo que alguma das outras entendesse o que ocorrera.
O líder gritava furiosamente enquanto os subordinados buscavam por suas armas.
- Maldito! Ah! Maldito! Vou fazer churrasquinho com as tuas bolas e depois jogar futebol com sua cabeça! Tão esperando o que, porra? Uma merda de convite da madre Teresa? Vão logo! Quero ele empalado na porra da entrada dessa cidade.

***

Os corsários entrariam na estalagem com suas facas em mãos. Stronghold escondeu-se atrás do balcão, tateando por algo que pudesse ser usado como arma e não conseguindo nada melhor do que uma tábua solta do chão.
Assim que a porta dos fundos rangeu, denunciando os atacantes que dali vinham, o Xerife atacou, acertando pauladas nas cabeças e colunas das coisas, quebrando-lhes os crânios e, por fim, os pescoços.
Deixou-as lá, inertes no chão.
Johnny Jones o esperava do lado de fora da estalagem. Tinha um sorriso em sem rosto.
- Bravo! Bravo! Muito bom! – Gritava enquanto batia palmas – Incrível, Xerife! Conseguiu! Quem diria!
- Ok, você enlouqueceu ou sempre foi assim? Não percebeu que matei todos seus companheiros?
- Loucura? Ora, o que é a loucura? Enfim... respondendo à sua pergunta, ela seria válida, mas você errou em dois pontos básicos: Primeiro, você não as matou, elas já estavam mortas e segundo, não passavam de marionetes, me recuso a ser colocado no mesmo nível que elas. Eram malditos bonecos, desprovidos de qualquer sentimento ou emoção que eu não queira que tenham. Escute... acho que ocê num percebeu ainda, né? Zóia eles de novo, vai. Acho que ocê vai sacar.
Fez como pedia Johnny, aproximou-se de um dos corpos. Já o tinha visto em algum lugar, sem dúvida... mas onde...? onde...? Ah!
- Percebeu, né? Ééééé, xerife, a gente não esquece dos rostos cujas vidas tiramos... Agora que você o fez duas vezes... Sabe, achei esse aí numa cova pertinho daqui... a terra inda tava fofinha fofinha quando tirei ele. Pobre Scott... Ele era um puto! Hah!
...
- Como sei que você o matou? É isso que você quer saber, não é?
Silêncio.
- Quando faço o que faço, posso ver tudo que a pessoa fez em vida... inclusive quem a matou. Interessante, não? Ah, quer ver outra coisa interessante? Reparou como seus trapos tão rasgados? Que coisa, não...? Ora, que é isso, não achou que tinha saído de uma luta contra dois homens armados com facas sem nenhum arranhão quando você só tinha uma faca, não é?
Silêncio novamente.
- Por quê não sente dor? Óia aí, mais um treco interessante... depois da minha mágica, a única dor que cê sente é aquela que te deu fim. Ah, vai dizer que isso não é interessante?
Mais uma vez, silêncio.
- Que é isso, não quer falar comigo? Então ocê vai escutá memo. Agora vai acontecê o seguinte: Cê vai dormi, e quando acordá, as carroça não vai tar mais aqui, meus cabra vão ter virado pó e eu vô ta bem longe. Sabe... eu ia mesmo te matá... mas pensei... alguém que consegue dar cabo de tanto cabra que nem você, que tem uma história que nem a sua... podia usar isso aí... eventualmente. Por enquanto tu ta livre... Viva sua morte enquanto pode, xerife. Viva sua morte.
Dito isso, Johnny girou junto com o mundo ao seu redor e tudo se apagou para o xerife, como se alguém tivesse apagado tudo, inclusive a Lua e as estrelas.
Stronghold acordou no dia seguinte, e, assim como Jones dissera, as carroças haviam sumido. Na cidade inteira, apenas um de seus habitantes sobreviveu, seu nome era Tom, agora órfão, foi acolhido pelo xerife e mais tarde seguiu os passos de seu tutor, hoje ele é xerife de uma cidadezinha não muito longe de sua antiga casa. Até hoje o pôr do Sol lhe dá arrepios.
William Stronghold aposentou-se alguns meses depois do ocorrido e hoje é dono de uma pequena mercearia na costa leste. Não passa um único dia sem que se pergunte quando o destino virá a seu encontro na forma de um gato rajado.
Mal sabe ele que esse dia não só está próximo, como esse dia é hoje.

Minha Viagem com J. P. Harris


Minha Viagem com J. P. Harris
“Fiend strike me blue! I’m scarce able to walk,
And damn me if I can stand upright or talk!”
H.P.Lovecraft
Sempre tive uma vida normal, sem grandes aventuras ou emoções, bom, isso até que J. P. Harris entrou em minha vida.
No dia, estava no meu habitual banco de praça onde costumava almoçar nos meus trinta minutos de intervalo entre as aulas da manhã e da tarde quando ele veio a mim.
- Ei garoto! Gritou. Era um homem de baixa estatura e de meia idade usando um casaco de couro fechado e jeans.
Perguntei se era comigo, ele assentiu.
- Escuta... quer ver algo incrível? Algo que vai mudar seu jeito de ver e entender o mundo? Algo que vai abalar suas estruturas?
Eu, como simples estudante do ensino fundamental sempre fui instruído a nunca confiar em estranhos, mas ele... não sei explicar, ele tinha essa espécie de aura emanado de seu corpo que passava um sentimento de calmaria.
Insistiu mais um pouco e me deixei ser levado.
O homem me guiou por ruas que jamais havia visitado, pelas vielas tortuosas e estreitas que compunham a parte leste da cidade.
Andamos muito e rapidamente, mas nossas passadas não impediram o anoitecer, que veio sorrateiro, acompanhado das fracas luzes da iluminação pública que se acendiam ao nosso lado.
J. P. apertou o passo, entrando cada vez mais fundo nas entranhas da cidade.
- Estamos quase lá! Dizia – Só mais um pouco e... Aqui estamos!
Passei por ele e pude distinguir um lago que se estendia na imensidão negra da noite.
- Acho que já vai começar...
Pouco depois desse comentário, pude perceber que o lago começava a emanar um pequeno brilho, como se cada molécula de água estivesse emanando uma fraca faísca. Tentei perguntar a meu acompanhante o que aquilo significava, o que acontecia ali, mas este mandou que eu calasse a boca e prestasse atenção no centro do lago.
Fiz o que ele me mandava. Agora, a luz que emanava do lago tornara-se muito mais forte, tornando possível a visualização de seu fundo. Por fim, mirei em seu centro, e ao fazê-lo, percebi que algo se movimentava ali, algo que... Então eu vi.
A criatura parecia um peixe comum, mas era vermelha cor de brasa e sua cabeça não era de peixe... Era humana. A face tinha uma expressão triste, depressiva. Quando dei por mim, estava imaginando o que ela queria dizer, porque estava tão aflita. Pode-se dizer que sua expressão foi para mim o que o sorriso da Mona Lisa é para alguns, e arrisco dizer até mais. De súbito, quis tocá-lo, chegar mais perto dele.
Corri freneticamente para o lago, tropeçando em um galho solto, arranhando meu antebraço e cortando a palma da minha mão profundamente, mas aquelas feridas pareceram não doer, então continuei.
Mergulhei no lago, o ar da noite entrava com esforço em meus pulmões junto com a água fosforescente do lago enquanto nadava em direção à criatura. Logo, podia senti-la mais perto, podia ouvi-la, logo nos tornaríamos um só corpo, um só espírito, podia sentir que sim.
Nadei pouco mais que vinte metros, e quando finalmente cheguei a poucos centímetros da criatura meus músculos deixaram de responder por conta da exaustão. O ar começara a se esvair de mim lentamente e sentia que começava a afundar.
Ali, junto à criatura, cheguei ao fundo do lago, e antes de perder completamente meus sentidos acho que consegui ver um olhar de decepção naquela face estranha. Ali, no fundo do lago que começava a perder seu brilho, morri.
Acordei no dia seguinte como se acorda de um sonho no banco da praça onde me encontrava antes de H. P. Harris se aproximar. Devo dizer que foi uma das melhores noites de sono que já tive, mas por algum motivo estava cansado e dolorido. Tinha que ir para casa, meus pais já deviam ter chamado a polícia para me procurar.
No caminho de volta, cruzei com o que poderia ser uma perfeita versão de H. P. Harris em frente à sorveteria, exceto que essa versão era anos mais jovem.
Entrei em minha casa, louco por minha cama. Entrei em meus pijamas e fui escovar os dentes. Entrei no banheiro, mas o espelho não mostrou a imagem que esperava que mostrasse. O espelho mostrava a face da criatura que vira no lago envelhecida no mínimo em vinte anos, o espelho mostrava minha nova identidade.

E você? Quer ver algo incrível? Algo que vai mudar seu modo de ver e entender o mundo? Algo que vai abalar suas estruturas? Pois eu vi, e me sinto ótimo.

A Gruta


A Gruta:
Preso                                                                                                         Sozinho
                            Perdido
Edgar encontrava-se no meio da gigantesca floresta que se localizava ao norte do castelo onde seu pai servia, contudo, não tinha a menor noção de onde estava e, naquele momento, desejava como nunca desejara antes ter seguido as ordens de seus pais e ter ficado longe daquela maldita floresta que eles diziam ser amaldiçoada.
Dois dias já haviam se passado desde que entrara naquele inferno, agora esses dois dias pareciam se tornar anos.
Até ali, conseguira algumas frutas que havia encontrado em árvores e arbustos, mas sentia vontade de algo mais palpável. Tinha quase certeza de que vira um coelho por entre as árvores e pegou-se imaginando o gosto da carne macia tocando sua língua e descendo suavemente por sua garganta.
Por fim, andava. Dia e noite, andava. Já não havia passado por aquela pedra?
Sussurros.
Já havia escutando aqueles sussurros no final de seu primeiro dia ali, mas agora sentia que estavam ficando mais fortes, mais constantes. De onde vinham? Não sabia. Quem sussurrava? Não sabia. O quê falavam? Não sabia.
Não sabia. Não sabia. Não sabia.
Passos?
Passos!
Ouvia folhas secas sendo pisadas à distância.
De onde vêm?
Esquerda?
Direita?
Esquerda!
Correu.
Gritou.
Tropeçou.
Rolava.
Galhos, folhas, pedras, Tronco.
Um zumbido ecoava em sua cabeça e o braço havia entortado para baixo, provavelmente quebrado, mas Deus! Como a cabeça doía!
Levantou.
Olhou.
Uma... Gruta?
Sim, uma gruta com um pedaço de madeira com formato parecido com o de uma porta podia ser vista à distância por entre as árvores retorcidas.
Procurou palavras, mas só encontrou grunhidos.
Resolveu entrar.
A gruta encontrava-se escura, com exceção de duas velas, que projetavam círculos de luz em potes e pedras apoiados prateleiras mal construídas.
Novamente, procurou palavras, mas estas novamente recusaram-se a servi-lo.
-Quem és tu? – A voz cavernosa fez com que se virasse rapidamente com um pulo.
Tentou responder, mas só conseguiu articular poucos grunhidos.
- Quem és tu, filho de Belzebu? Cansaste de me perseguir? Cansaste de entrar em minha cabeça com suas vozes malditas e agora aparece a mim? – Gritava o velho barbudo em seus trapos – Quem és tu? Responde-me, eu te suplico! Se és real, diga! Leva-me dessa prisão! Leva-me, por Deus!
Afastou-se, pronto para correr para bem longe dali.
- Não! Volta! Fica! Não me deixes aqui!
Correu.
Formas passavam rapidamente por seus olhos enquanto o vento zumbia em seus ouvidos junto com os gritos daquela aparição.
Correu.
Correu mais.
Correu mais ainda e...
Tronco.
Levantou-se.
Olhou.
Sonho?
Nem sinal da gruta.
Sussurros.
Passos?
Preso                                                                                                         Sozinho
                                                                                            Perdido

22 de Outubro de 1862


22 de Outubro de 1862
Nem tudo é como deveria ser, nem sempre a vida nos é justa, mas temos que aprender com ela. Não fui exceção.
Na época, passava um pouco de meus nove anos. Naquele dia fazia sol, eu chegava em casa da escola. Passei pelo hall e pela sala de estar, silêncio... Estranhei, mas continuei. A cozinha, o quintal... nada.
Subi as escadas e ouvi sussurros vindos do quarto de meus pais.
Entrei.
No quarto, minha mãe e meu pai. Ele com sua farda e seu quepe, cobrindo-lhe a metade superior do rosto do ângulo que sua cabeça estava; Ela com seu vestido de renda longo azul claro, o rosto coberto de lágrimas.
- O que aconteceu? Perguntei assustado como... Bem, como uma criança.
Recebi não mais do que frases soltas como resposta. Algo sobre D. Pedro, algo sobre o Paraguai, algo sobre uma guerra.
- Mas você precisa mesmo ir?
A pergunta era idiota. Colocou-me em seu colo, aquele colo enorme que sempre parecia ficar menor com o tempo, olhou-me, seus olhos castanhos mirando os meus com sua firmeza inabalável. Eu sabia o que ele iria responder, e ele também sabia. Por isso, e vez de responder, fez algo mais. Abraçou-me. Abraçou-me como jamais abraçara. Ali senti algo, senti dor. Não por sua partida, mas pela incerteza de sua chegada. Pude sentir tudo que meu pai já havia feito por mim naquele abraço, suas conquistas e seus fracassos, suas alegrias e suas tristezas, lembrei-me de cada sorriso, de cada tarde de domingo que passei com ele.
Quando por fim seus braços se afrouxaram não disse mais nada, pegou sua mala e partiu, sem olhar para trás. O momento em que a farda desapareceu pelo beiral da porta foi o momento em que de meu olho se desprendeu uma lágrima morta.
Os seis meses que se seguiram foram os mais difíceis de minha vida. Não tive coragem de perguntar a minha mãe se ela achava que meu pai voltaria, não queria ouvir mentiras, mesmo que estas trouxessem uma faísca de esperança a mim. Pelo contrário, gostava de encarar a verdade, o que não me impedia de fazer visitas freqüentes ao quarto da minha mãe e ficar esperando que aquela farda e aquele quepe aparecessem novamente à porta. O que não me impedia de esperar que meu pai surgisse e me tomasse em seu colo novamente.
Certa vez estava lá, esperando pelo quepe e pela farda, quando um quepe e uma farda realmente surgiram por entre a porta, mas o quepe e a farda errados, aqueles eram menores e mais vazios. Vinha falando de uma batalha no rio da Prata, de um acidente, de um navio afundado, se meu pai retalhado.
Morto? Não. Pelo menos ainda não.
Outras duas semanas sucederam aquela visita. Não sei dizer se foram melhores ou piores do que os meses que os precederam, mas assim como estes, aqueles passaram.
Estava em minha cama quando minha mãe me chamou à sala. Desci. Vi a farda. Vi o quepe. Vi meu pai. Vi que lhe faltavam as pernas e metade da mão direita.
Corri até ele.

Um abraço
Um choro
Um reencontro.
Um Pai
Um Filho
Duas lágrimas em comunhão.

Rio de Janeiro, 22 de outubro de 1862.

À Três Palmos da Morte


A Três Palmos da Morte
Em 1965 na pequena cidade de Ouro Preto um crime hediondo acontece, uma das famílias mais nobres e influentes da cidade é brutalmente assassinada, o inexperiente detetive Lucas Crane é chamado para investigar. O corpo do filho mais novo de cinco anos havia sido encontrado na lareira, quase completamente queimado, o corpo do filho mais velho de vinte e um, na sala de jantar, com o lustre que antes pendia no teto, encravado em seu peito, mas o que mais chamava atenção era o corpo da mãe, encontrado no velho escritório da casa, a mulher estava nua, em um grande círculo com um Pentagrama feito de sangue dilacerado por o que parecia ser uma espada que ficava em um quadro em cima da lareira. O detetive aproximou-se do corpo, o examinou e disse ao outro oficial que o acompanhava:
-Alguém sabe do pai?
-Aparentemente um dos vizinhos o viu saindo correndo da casa com um tipo de revólver na mão e com as vestes banhadas em sangue, - disse Pietro Veracruz, o policial parara para respirar um pouco de ar fora da sala escapando do cheiro de podridão em que a sala estava envolvida e por fim completou – O vizinho se assustou e chamou a polícia, o oficial bateu à porta umas cinco vezes, quando não obteve respostas derrubou a porta e encontrou o nosso “amiguinho” da lareira.
-Me diga uma coisa Pietro, há quanto tempo o vizinho chamou a polícia? - Perguntou Lucas.
-Eu diria que umas duas horas.
-Ótimo, ordene uma busca geral pela cidade.
Dois dias após o incidente os oficiais terminaram as buscas sem êxito, Antônio Mordock foi dado como foragido da lei, aparecendo três anos mais tarde morto em Belo Horizonte.
I
Jean Tartarelle, despreocupado, ouvia seu Walk-Man no carro de sua mãe enquanto esperava chegarem ao seu destino. O garoto tinha 14 anos, cabelos negros, olhos azuis e usava um Nike novo que sua mãe lhe comprara. Ele, seus pais e seu irmão de 7 anos estavam indo para sua nova residência em Ouro Preto.
O carro havia parado em frente à uma casa não muito diferente das demais que se encontravam ali, que tinha a pintura quase que inteiramente descascada e um velho lampião enferrujado colocado na sacada.
Jean desceu do carro com um pouco de dor nas costas causada pela posição em que o garoto ficara no carro e reparara que ja era tarde.
Ele se aproximou da casa e admirou a velha construção por algum motivo a casa lhe dava uma estranha sensação de que já estivera ali, observou a casa por algum tempo e foi ajudar a mãe a carregar sua mala para dentro do aposento.
A sala de visitas estava cheia de poeira, com dois sofás velhos e uma lareira não usada há algum tempo, o menino prosseguiu pela casa chegando a uma sala onde havia uma escada, levando ao andar superior, e duas portas, uma de cada lado mostrando certa simetria.
O menino havia parado para escolher qual rumo tomar, até ser orientado pela mãe:
-Acho que os quartos ficam no andar de cima, mas se você quiser, pode ir conhecer a casa.
-Tudo bem mãe, só vou conferir meu quarto antes e depois vou ver os arredores. – Respondeu Jean.
Eles subiram para o segundo andar onde o chão era revestido por um lindo carpete vermelho com as paredes cobertas por um papel de parede azul.
Assim como o cômodo anterior, este também era simétrico, com uma porta no centro do andar e outras duas, em cada ponta do andar, mas com uma escada embutida no teto, com uma corrente para trazê-la ao chão quando fosse necessário.
Jean prosseguiu para o cômodo à direita. No quarto havia uma cama de solteiro, um guarda-roupas de madeira, um criado mudo e uma estante com um espelho nela.
Jean largou a mala em cima da cama, desceu às escadas e prosseguiu até a sala de jantar, onde estava uma mesa para umas vinte pessoas, um grande e fogoso lustre e uma outra porta ao fundo que provavelmente levava à cozinha.
O garoto não passou dali, suas pernas tremiam devido ao cansaço da viajem, ele subiu ao seu quarto, jogou a mala no chão e deitou-se ali, adormecendo quase que instantaneamente.
No sonho, ele estava no meio da sala de visitas, um homem colocava um pequeno garoto dentro da lareira ardendo em chamas, o garoto gritava feito louco, mas Jean não conseguia se mexer do lugar.
Ele acordou assustado, suando, ele esperou alguns instantes para analisar o que acabara de ver. Desceu as escadas novamente mas dessa vez, seguiu para o banheiro, tomou uma ducha ali e saiu um pouco da sombria casa, quando algo tocou seu ombro com uma voz cavernosa dizendo:
-Precisa de alguma coisa moleque?
-ahhh!Q-Qem é v-você? – Gaguejou Jean
-Eu sou Jimmy, moro na casa ao lado, você precisa de alguma coisa?
-N-Não... Eu... Eu estou bem...
-Muito bem, qualquer coisa é só chamar viu?-Perguntou o velho senhor.
-Ok...
O velho de cabelos grisalhos deu meia volta e adentrou a casa ao lado, novamente o garoto parou um instante para digerir o que acabara de acontecer mas fora interrompido por uma visão da outra casa ao lado, uma jovem garota de cabelos loiros e olhos azuis se vestia na janela aberta. A garota percebeu que estava sendo observada e desceu até a porta:
-Me desculpe, mas você estava me observando?- Perguntou a garota
-Eu... Eu... Sou o novo vizinho... E estava conhecendo os vizinhos. –Respondeu Jean. - A propósito, eu sou o Jean. – Completou ele estendendo-lhe a mão.
-Ah sim, eu sou Sophie - Respondeu ela apertando a mão do menino.
-Você saberia me dizer quem é a “simpatia” que mora ali na outra casa?
-Sim, ele é o senhor Banner, um senhor solitário que mora aí desde que eu me lembro, quanto a você, o que um rapaz da cidade grande vem fazer nessa cidadezinha do interior?
-Como você sabe que eu sou da cidade?-Perguntou Jean
-Bom, eu deduzi pelas suas roupas. –Respondeu ela
-Enfim, eu vim de São Paulo morar aqui já que minha mãe foi transferida para uma filial daqui.
-Sim, hey, você sabe o que aconteceu nessa casa trinta anos atrás não é?-Perguntou a menina apontando para a casa do Jean.
-Como? Trinta anos atrás?-Perguntou Jean
-É, trinta anos atrás o pai da família que morava aí matou a família inteira, ele colocou o filho mais novo na lareira, o filho mais velho ele matou com um lustre na sala de jantar, mas a mãe foi a morte mais bizarra, o marido a matou e a colocou em um círculo como se fosse um tipo de ritual.- Sophie tomou fôlego e prosseguiu - Na época a polícia fez várias buscas mas o cara só foi achado três anos depois quando ele se matou lá perto de Belo Horizonte
Jean nem se quer se despediu da menina, correu para a casa, e procurou os pais, encontrando o pai:
-Pai vocês nos trouxeram para uma casa onde mataram uma família inteira aqui?-Perguntou ele ao pai quase desesperado.
-Espera aí, me conte direito essa história. -Disse o pai curioso.
Jean repetiu ao pai exatamente o que ouvira da nova amiga, sendo interrompido quando os dois ouviram um forte barulho vindo do andar de cima.
-Pai... Onde estão a mãe e o Rodrigo?- Perguntou Jean tremendo.
-Sua mãe o levou para conhecer a cidade. – Respondeu o pai mais nervoso do que antes.
Os dois subiram as escadas cautelosamente as escadas, e se depararam com uma mensagem assustadora escrita em sangue:

“Sangue será derramado se os novos hóspedes continuarem na casa, a morte baterá na porta no final do dia de amanhã, saiam ou morram”.

Os dois homens que ali estavam se calaram, por fim correram para a porta de entrada mas esta não abria, correram para as janelas mas todas estavam trancadas, e com um ruidoso abrir de porta, uma figura parecida com um humano surgiu, mas estava com órgãos e parte do cérebro à mostra, envolta em sangue e com um punhal na mão. A criatura se aproximava dos dois, assustados, eles gritaram com toda a força por ajuda, mas a criatura avançara mais ainda, agora mostrando que aquilo parecia estar morto há muito tempo, o cheiro de podridão que exalava deixava claro que já estava em decomposição fazia algum tempo. Com um estrondo a porta se abriu e Jimmy esbravejou aos dois:
-Fujam daqui se não quiserem Morrer!
II
Jimmy rapidamente sacou uma espingarda um pouco enferrujada que dava a impressão de já não funcionar mais.
-Para trás!-Esbravejou ele para os dois enquanto puxava o gatilho.
A criatura caiu no chão, se contorcia e urrava de dor enquanto os ali presentes observavam a uma das cenas mais nojentas que já presenciaram, a criatura arrancava pedaços de seu próprio corpo enquanto murmurava palavras que nenhum deles entendia:
- Acto causa mortis, mortis causa acto, acto causa mortis, mortis causa acto...-A criatura repetiu a frase algumas vezes antes de morrer.
-“Aquilo” morreu?- Perguntou Jean ao senhor que os acompanhava.
-Não, ela simplesmente voltou ao sótão da casa - Respondeu Jimmy com um pesado tom de voz.
-“Ela”? Então você sabe o que foi aquilo?
-O seu nome, era Fernanda Mordock. Ela foi usada em um ritual pagão que devorou sua alma, deixando o corpo para trás. Na época, eu era encarregado da autópsia dos corpos, quando ordenaram a busca pela cidade, fiquei sozinho examinando aquela estranha cena de crime, quando... – Ele parou por um instante, levou a mão à cabeça alisando seus cabelos e continuou – Quando Fernanda Mordock se levantou bem diante de meus olhos, me olhou com aqueles sinistros olhos vermelhos e me atacou com uma força descomunal, agarrei a primeira coisa que vi que por sorte era o atiçador de brasas da lareira e acertei a cabeça dela. Eu corri, corri com todas minhas forças até a entrada, contei o que acabara de ver aos meus superiores e não acreditaram em mim, inclusive me indicaram para seções psiquiátricas... Após isso, pesquisei sobre rituais, mortes inexplicadas e finalmente achei o que procurava, o ritual era usado para dar a quem o fizesse a vida eterna. Mas isso só era possível dando a alma de outra pessoa em troca.
-Nessa parte que Fernanda entrava? – Perguntou Jean, agora curioso.
-Precisamente, ele prendeu a esposa no chão com estacas, eu imagino que a mulher sofreu muito. Mas isso resultou em uma fusão entre a moça e a casa, ou seja, agora ela protege esta casa e tudo nela e não pode sair da casa até que sua hora chegue.
-Mas quando vai ser isso? – Dessa vez era o pai de Jean perguntando.
-O ritual dava a ambos a vida eterna, mas somente a um deles a sua alma.
-Mas então, como vamos detê-la? – Perguntou Jean
-Eu acho que uma boa opção poderia ser pesquisar pelas palavras que ela dizia. - concluiu Jimmy.
Os três rumaram para a Biblioteca Principal da cidade, chegando lá ao anoitecer. A biblioteca estava vazia e escura, um carpete vinho revestia o chão e um tom de azul pintado nas paredes. Os três dirigiram-se à ala de línguas antigas da biblioteca, Jimmy passou o dedo na fileira de livros até achar o que ele procurava, jogou o livro empoeirado sobre uma mesa de madeira com detalhes dourados e o abriu na parte da letra “M” e começou a folhear.
- Jimmy o que você... – Jean foi interrompido por um estrondo roso “AHÁ” que o velho soltara.
- Aqui está! Acto causa mortis, mortis causa acto, ou seja, Um Ato Por Causa da Morte leva a um ato que causa a morte.
- Mas o que significa?
- É um paradigma, significa que ela anseia por mortes para compensar a própria morte.
- Existe alguma forma de pará-la? – Desta vez, o curioso era o Pai de Jean.
- Ao que tudo indica cortar o mal pela raiz.
- Você diz...
- Subir ao sótão, onde fica o escritório e destruir o círculo.
- Mas este espírito vai guardá-lo com todas as suas forças não vai? – Disse Jean, interrompendo a linha de raciocínio dos dois.
Eles se viraram para encarar Jean quando algo chamou a atenção de Jimmy, treze morcegos estavam ali a observá-los.
- Muito bem, os dois falem baixo agora – disse ele quase murmurando para os dois.
- Por quê? – Perguntou Jean
- O espírito não pode deixar a casa, mas controla todos os animais e coisas que vivem na calada da noite.
Ao dizer isso, os morcegos que antes só os observavam passaram a atacá-los com dentes e unhas, Jimmy jogou uma pistola ao companheiro e disse:
- Faça o que for preciso!
Dito isso, ele começou a atirar nos morcegos juntamente com o pai de Jean. Em questão de minutos os morcegos já haviam morrido.
- Certo, conseguimos sobreviver contra estes, mas quem sabe o que ele pode mandar na próxima.
- Na próxima? – Indagou Jean – Nós mal sobrevivemos a um ataque! Como espera que sobrevivamos aos próximos?
- Devemos nos preparar melhor para os futuros ataques.
- Espere um instante, que outras criaturas o espírito controla? – Perguntou o Pai do Jean.
- Bom, ele controla morcegos, alguns cães, gatos, cavalos e até mesmo construções.
- Como assim, construções?
- Bem, eu já vi ele construir becos sem saída para a pessoa que ele persegue, até mesmo atirar tijolos soltos se a pessoa não tomar cuidado.
- Como é possível um espírito fazer tudo isso? – Perguntou Jean.
- Não sei bem ao certo, acho que o ritual o deu mais forças do que podemos imaginar.
Os três voltavam pelas escuras ruas, agora já à noite quando Jean se lembrou de algo:
- Pai, a mãe e o Ricardo já devem estar em casa agora!
- Oh meu Deus! É verdade! Como podemos esquecer disso?
- Esquecer do que? – Perguntou Jimmy.
- Minha esposa tinha levado meu filho menor para conhecer a cidade, e a esta hora já devem ter voltado!
- Então é melhor corrermos para lá, não sei o que o espírito pode fazer com eles se os pegar!
III
Os três homens corriam pelas ruas desertas de Ouro Preto às 00h00min, quando um relinchado os fez parar. Cinco cavalos com o pelo de cor negra e olhos vermelhos estavam bloqueando a passagem deles à rua enquanto avançavam vagarosamente.
Jimmy há esta hora já estava com sua espingarda em mãos, enquanto os outros dois estavam prontos para correr. Os cavalos começaram a avançar mais rápido agora, quando Jimmy deu seu primeiro disparo. O tiro foi preciso e eficiente, atingindo o coração do cavalo do meio e fazendo este cair sobre o cavalo ao lado. Os três cavalos restantes os cercavam agora, trotando em círculos.
Jimmy abriu a caixa de munição que carregava no bolso e gritou aos outros dois:
- Eu estou sem munição aqui! E quanto à vocês?
-Eu tenho só mais uma bala. Respondeu o pai de Jean.
- Ótimo, mande para cá.
O pai de Jean obedeceu sem hesitar, jogou a arma ao companheiro e este por sua vez a pegou.
Jimmy mirava em um dos cavalos quando um outro avançou sobre Jean.
Jimmy rapidamente mudou a direção da arma e desferiu um outro tiro perfeito no coração do cavalo.
Os cavalos agora, restando apenas dois, se posicionaram um a frente deles e um nas suas costas.
Sem saber o que fazer, Jean correu para a casa mais próxima e bateu à porta na busca de ajuda, mas ao fazer isto o cavalo da frente avançou sobre ele fazendo-o cair para trás.
Os outros dois homens correram para ajudá-lo, mas foram impedidos pelo outro cavalo, que agora bloqueava a passagem deles para a varanda.
O cavalo em cima de Jean soltou um longo relinchado seguido pela sua queda.
Sem saber o que acabara de acontecer, Jean observou o cavalo mais de perto.
O cavalo estava com uma pequena faca que fora jogada com precisão em seu olho.
Jean se virou para a porta, onde um homem de estatura mediana, roupa de motoqueiro, cabelos loiros e olhos castanhos.
O homem sacou uma K-47 e atirou no cavalo algumas vezes, mas diferente de Jimmy, este não atingia pontos vitais, ele atingiu a perna, a barriga, as costas e finalmente um tiro atingiu sua cabeça matando-o.
Feito isto, ele estendeu a mão para Jean dizendo:
- Você está bem?
- S-sim... Eu estou bem... Quem é você? – Disse Jean enquanto era erguido pelo estranho.
- Você pode me chamar de Fred... Posso saber o que aqueles cavalos faziam no meio da noite atacando vocês?
- Eu explico... – Disse Jimmy.
Jimmy explicou todo o ocorrido, desde o assassinato dos Mordock em 1965 até o que descobriram na biblioteca.
- Eu já tinha ouvido falar desse assassinato que tinha ocorrido trinta anos atrás, mas o resto é novidade para mim.
- Sim, e agora temos de encarar um fantasma semi-indestrutível, suas criaturas da noite e sem munição. – Dizia Jean, enquanto os outros três ali presentes se davam conta do problema.
- Munição eu posso lhes oferecer, e posso ir junto com vocês. – Disse Fred enquanto fazia sinal para os três entrarem. – Nós podemos partir amanhã quando estivermos mais descansados, já que de manhã as criaturas não podem nos atacar.
- Mas minha mãe e meu irmão estão naquela casa!
- Jean... É melhor assim. Não temos forças suficientes para lutar contra as criaturas dela, quanto menos contra o fantasma em si. – Dizia o pai de Jean enquanto colocava a mão no ombro do garoto fazendo menção para que ele entrasse.
A sala na qual eles entravam tinha um sofá grande, para seis pessoas, uma poltrona, uma lareira, uma espingarda em cima da lareira e um grande lustre dourado pendurado no teto.
- Bem vindos à minha humilde residência – Dizia Fred enquanto seguia para uma escada no canto da sala levando para o porão. – Venham por aqui, aqui tenho camas e munições.
Os três o seguiram pelas escadas à baixo e acabaram em uma sala com várias armas de vários tipos penduradas nas paredes de tijolos à mostra e alguns sacos de dormir no canto.
Fred caminhou até o canto onde os sacos estavam e estendeu três deles no chão.
- Vocês podem dormir aqui por hoje. Espere um pouco que vou arranjar algo para vocês comerem. – Disse ele enquanto subia as escadas novamente.
Jean percebera que não comia desde que chegara a casa onde tudo começou.
Os três esperaram cerca de quinze minutos ali quando Fred voltou com três pratos com dois Cheese Burgers em cada.
Cada um dos três pegou um prato e começaram a comer.
- Você parece gostar de caçar Fred... – Disse Jimmy enquanto observava as armas na parede.
- Bem, realmente eu caço um pouco de vez em quando.
Os homens conversaram mais um pouco em quanto terminavam de comer. Cerca de meia hora depois, os três já haviam terminado a refeição e entregado os pratos para Fred.
Fred subiu as escadas e desapareceu. Quando cerca de quinze minutos depois os três ouviram um grito que ecoou na casa inteira.
IV
Os três correram desesperadamente escada acima e se surpreenderam com a cena que viram:
Cães e Morcegos estavam atacando Fred, se agarrando nele com os dentes.
Jimmy pegou a K-47 que repousava sobre a poltrona e começou a atirar nos animais que atacavam Fred.Os animais por sua vez, começaram a atacar Jimmy e a deixar Fred de lado.
Fred se ergueu e correu para o porão chamando Jean e seu pai. Eles o seguiram.
No porão Fred jogou uma pistola para cada um, pegou uma para si e voltaram correndo para o térreo, onde Jimmy estava deitado no chão sangrando enquanto os animais o atacavam.
Os recém chegados começaram a atirar nos animais sem muita precisão, mas o suficiente para fazê-los recuar após algum tempo.
- Jimmy! – Gritava Jean.
- Acalmem-se! Tenho um kit de primeiros socorros no banheiro. – Disse Fred correndo casa adentro e voltando com uma caixa branca com uma cruz vermelha nas mãos.
Fred fez curativos em Jimmy e o colocou repousando no sofá.
- Como ele está? – Perguntava Jean.
- Eu não sou médico, mas acho que ele vai ficar bem até amanhã pela manhã. – Respondeu Fred.
Cerca de duas depois os três foram dormir. A noite estava fria e silenciosa. Jean demorou a dormir, mas quando o fez, sonhou que estava em sua casa, para der mais exato, na sala de jantar. O mesmo homem do último sonho prendia um homem mais velho que Jean em uma mesa, após o cara suplicar por piedade, o homem finalmente desprendeu o lustre do teto com uma chave de fenda. O lustre caiu perfeitamente na caixa torácica do homem preso à mesa, o silenciando de uma vez por todas. Novamente, Jean não conseguia se mexer, ele acordou com um pulo, assustado.
O dia raiava fora da casa, cerca de oito horas da manhã deduziu ele. Todos já estavam acordados, com a exceção dele.
- Bom dia, pronto para partir? – Perguntou Fred.
- Certo, vamos logo então. Só me deixe comer algo. – Respondeu ele.
Fred trouxe para ele um pão francês com manteiga e um pacote de bolachas recheadas. Jean as comeu em questão de cinco minutos e se aprontou para o que estaria por vir.
Os quatro desceram até o porão, cada um escolheu uma arma, pegaram munição e suprimentos e esconderam tudo em mochilas e de baixo das roupas.
As ruas estavam cheias de gente, bem iluminadas e mais calmas. Diferente da noite anterior. Os quatro andavam pacificamente pela calçada com a certeza de que eles não seriam atacados, o que de fato, aconteceu.
Ao chegarem a frente à casa, Jimmy falou:
- Muito bem, é chegada a hora cavalheiros. Todos prontos?
-Sim! – Responderam eles em tom uníssono.
- Então saquem suas armas e vamos.
Todos os quatro ficaram com suas armas prontas e marcharam em frente.
Jimmy abriu a porta com cuidado. Vários morcegos saíram da casa em pânico, os quatro passaram pela sala de visitas, subiram as escadas. No segundo andar Jean apontou para a corrente de metal pendurada no teto:
-Acho que é ali. -disse ele.
Sem dizer nada, Jimmy puxou a corda, que revelou uma escada embutida no teto.
-Estou com um mau pressentimento – Disse Fred.
- Mal é o que não sobra por aqui. – Acrescentou Jean.
- Parem de tagarelar e vamos logo! – Interrompeu Jimmy enquanto fazia sinal para avançarem.
O sótão estava totalmente empoeirado, cheio de móveis velhos e com uma porta à direita e uma janela à esquerda.
Jean se aproximou da extremidade contrária à porta e descobriu sua mãe e seu irmão amordaçados e presos.
-Aqui! Venham rápido! – Gritou ele.
Os outros três correram na direção dele.
-Ok. Esperem um pouco! – Disse Fred enquanto puxava uma faca do bolso e começava a cortar as cordas.
Fred já libertara a Mãe de Jean enquanto terminava de soltar Ricardo quando o grito da besta foi ouvido por todos.
-Fred, termine isso logo! – Gritou Jimmy com a arma em mãos.
-Estou tentando Droga! – Respondeu Fred quando finalmente a corda se rompeu.
Com um estrondo a escada se fechou na frente deles e Fernanda apareceu na porta para o escritório.
Jimmy disparou repetidas vezes contra a criatura, mas desta vez ela avançou nele, fazendo com que ele caísse no chão.
Fred atacou desesperadamente tentando salvar a vida do companheiro, quando a coisa levantou a mão.
Como por impulso todos ali menos Jimmy foram jogados para fora da janela, mas antes de tocarem o chão, a velocidade diminuiu e eles pousaram suavemente no chão.
-O que foi isso? – Perguntou Fred quase rouco.
-Não tenho certeza... – Disse Jean.
-Bom, é melhor irmos embora, está anoitecendo.
-Mas Jimmy está lá!
-Jean... Não podemos fazer nada por enquanto. – Disse seu pai enquanto voltavam para a casa de fred.
V
Ao chegarem à casa de Fred, Jean não disse uma palavra sequer, o som de seus pais conversando e de Fred preparando algo na cozinha o deixava mais calmo, o suficiente para cair no sono.
Em sonho, ele viu todos os antigos sonhos, os dois assassinatos, mas dessa vez era Jimmy quem matava os garotos, mas não era o Jimmy que ele conhecia, este estava mais jovem, coberto de sangue e com o olhar raivoso, Jean acordou estranhamente calmo, associando que a perda de Jimmy tivesse influenciado nos sonhos.
Assim que Jean se levantou seu pai lhe chamou para uma conversa:
- Jean... Eu e sua mãe conversamos, e achamos que é melhor se sua mãe você e seu irmão ficarem aqui por hora.
- Como? Você quer que eu fique aqui enquanto vocês dois podem morrer lá?
- Olhe, já chega de você fazer o que você quer! Está na hora de aprender a ter respeito por seus pais...
Ao dizer isso, um cavalo branco apareceu em frente a eles, e fez uma reverência a Jean, que por sua vez se aproximou e, sem nenhuma explicação montou o animal. No exato momento em que Jean Montou o animal este se transformou em um cavalo esquelético de olhos vermelhos e pelos negros, o cavalo disparou em direção a parede e ao atingi-la a atravessou como se não houvesse nada ali e rumou para a casa em que residia Fernanda.
- Mas... O que foi aquilo? – Disse Fred que acabara de entrar na sala.
- Acho que ela está nos atraindo. Mas infelizmente não temos como não ir lá. – Disse o pai de Jean com tristeza na voz.
- Acho bom nos prepararmos para tudo então. – Disse Fred enquanto descia as escadas procurando armas “muitas armas” pensou ele.
Não demorou a que Fred retornasse com pouco mais de quinze armas nas mãos, atirou algumas para o pai de Jean dizendo:
- Pegue, temos que ir agora! Não sei o que ela pode fazer com ele.
Ele obedeceu e antes que pudesse perceber, Fred estava à porta, se dirigindo para a casa.
- Espere! – Disse ele correndo para alcançá-lo.
Finalmente depois de três minutos de caminhada chegaram ao destino almejado.
Fred empurrou a porta, que dessa vez estava trancada.
- Ah droga, não queria ter que fazer tanto escândalo logo de cara. – Disse ele enquanto tomava distância e desferia um chute na porta, que se quebrou no meio com um estrondo.
Eles correram escada acima em direção ao sótão novamente, ao chegarem lá, se viram em um espaço totalmente branco, Jean estava montado no cavalo com os olhos totalmente brancos, e brandindo uma espada com ferrugem e amarelada. O cavalo começou a andar, e em um golpe Jean quase cortou a cabeça de Fred fora.
- Jean! – Gritava Fred – Jean pare! Acorde, não deixe ele te controlar!
O cavalo avançou novamente, e Jean conseguiu desferir um golpe na perna de Fred, suficiente para esta cair de lado.
Fred gritava de horror e de dor, enquanto o pai de Jean pulou no cavalo e arrancou o garoto dali. Ele arrancou a espada das mãos do garoto e a cravou no crânio do animal. Jean acordou horrorizado com a situação que Fred estava. Fred conseguiu se acalmar e estancar o ferimento ele próprio.
- Me desculpe, por favor, eu só lembro de ter olhado nos olhos do cavalo, e depois... – Disse Jean com uma das mãos na cabeça -... Depois nada, e então eu caí do cavalo como se tivesse acordado de um sonho...
- Tudo bem. – Disse Fred – Poderia ter sido muito pior, você poderia estar morto, ou ter me matado, em todo o caso estou bem. Mas... Olhem, a porta por aonde viemos simplesmente sumiu! – Disse ele se dando conta da situação
Antes que qualquer um percebesse, estavam de volta a casa, Fernanda estava à frente da lareira com seus dois filhos, contemplando o fogo como se fosse algo mágico para eles, quando Antônio entrou na sala, ele estava coberto de símbolos feitos de sangue e gritava para a esposa:
- Eu preciso que você vá ao sótão para uma conversa meu bem – Dizia ele com elegância -, Pode ir que eu já vou, só vou cuidar de algo aqui está bem? – Disse ele empurrando ela para as escadarias. Ela subiu a escada aterrorizada, o que o marido estava fazendo? E o que “cuidar de algo” significava? Estas perguntas circulavam na cabeça dela quando os gritos começaram gritos de dor vindos de o primeiro andar, ela subiu o último degrau e abriu a porta para o escritório correndo, e quando assim o fez se deparou com círculos e escritas que desconhecia, e todas escritas em sangue.
- Meu amoor – Ela ouviu o marido chamando do segundo andar – Eu tenho um presentinho pra vocêe.
Ela entrou dentro do armário que ali repousava e ficou mais quieta o possível, até que ouviu a porta do escritório se abrindo.
- Onde será que está você? – Disse ele se voltando para o armário. – Será que está aqui? – Disse ele abrindo o armário. Fernanda gritou em plenos pulmões para que ele a soltasse, mas ele continuou:
- Ora ora, eu tava te procurando, temos algo muito especial pra hoje.
De repente a visão se escureceu, e o ambiente voltou a ficar branco.
- Mas... O que foi isso? – Perguntou o pai de Jean.
- Acho que ela quer nos passar uma mensagem... – Disse Jean, quando eles se viram no sótão novamente, mas dessa vez sem um ruído se quer.
- Nós voltamos, mas eu ainda não entendi – Disse Fred.
- Bem, meu amigo, o que minha mulher quis dizer é que eu a matei, matei meus filhos e provavelmente também vou matá-los. – Disse a voz de Jimmy atrás deles.
Os três se viraram com uma rapidez extrema, talvez pela surpresa, talvez pelo susto, mas o fato que acabaram de ouvir parecia não entrar na mente deles, expressado por um “mas” de Jean.
- Na verdade é simples, não desconfiaram que eu soubesse demais do assunto? Não desconfiaram que eu soubesse de meios demais para impedi-la? Sim meus caros, sou Antônio Mordock, o assassino de tantos anos atrás. – Disse Jimmy com êxito – Como vocês vão morrer lhes contarei o porquê disto. Após fugir de Ouro Preto e de me estabelecer em Belo Horizonte, à polícia começou a se aproximar do meu paradeiro, logo tive que despistá-los, fingindo a minha morte. Quando voltei para cá, eu descobri que o espírito de minha amada residia na casa, eu tive que esperar por um grupo de idiotas para me ajudar. Agora que lhes resumi o trajeto todo até aqui, digam adeus. – Disse ele com indiferença erguendo – lhes a mão, quando os restos de Fernanda apareceram da escuridão e o agarrou, a coisa mordeu-lhe a nuca, fazendo sangue jorrar por todos os lados. Antônio gritava de raiva desferindo socos enquanto a criatura o comia vivo.
Aproveitando o momento de distração de seu perseguidor, Jean e seu pai carregaram Fred para o 1º andar e abriram a porta, o sol lhes atingiu a cara em cheio. Eles tinham escapado.